quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Não podemos deixar o mundo como o encontrámos III

A Colômbia, bem como os países participantes neste curso possuem democracias recentes, ainda com muitas debilidades, situações económicas precárias, desigualdades sociais enormes, taxas de analfabetismo elevadas, comunidades rurais e indígenas muito pobres e cidades superpovoadas onde a violência, a pobreza e o desemprego são uma constante. Dos países participantes Belize e Cuba são a excepção. O primeiro não tem os problemas sociais e económicos típicos da América Latina. O segundo vive há várias décadas sob um regime comunista.

Para além dos problemas já mencionados que afectam a América Latina, a Colômbia vive uma situação de conflito armado há mais de 40 anos acentuado pelo narcotráfico e pelos milhares de refugiados que fogem das zonas de conflito em direcção às cidades.

Nestes países as bibliotecas, especialmente as bibliotecas públicas, tem adoptado estratégias e criado serviços capazes de responder às necesidades destas populações pobres e analfabetas ou pouco instruídas.

Aqui em Medellín, cidade que durante muitos anos foi dominada pelo narcotráfico e pela violência gerada por esse mesmo narcotráfico, as bibliotecas públicas e os bibliotecários desempenham actualmente um papel fundamental na renovação e desenvolvimento da cidade.

Com este curso pude constatar no terreno o papel social que as bibliotecas públicas podem desempenhar no desenvolviemto local e na melhoria das condições de vida das populações.

A biblioteconomia que se pratica aqui não é uma biblioteconomia de gabinete. O compromisso social destes bibliotecários é uma realidade que se traduz em serviços e actividades dirigidas aos mais pobres, desfavorecidos e carentes de informação e conhecimento. E quando falo de pobres falo de gente miserável que vive em bairros de lata, de sem abrigos, de criancas de rua, de analfabetos, de toxicodependentes, de prostitutas, de reclusos. Enfim, falo de todos aqueles que nas nossas bibliotecas públicas não tem lugar nem encontram apoio ou resposta às suas necesidades de informação, apesar das ditas bibliotecas se denominarem públicas.

Com recursos materiais e humanos reduzidos e em condições sociais e políticas adversas muitas destas bibliotecas são hoje agentes de mudança. Mas ser agente de mudança implica abandonar a posição cómoda de neutralidade e imparcialidade que muitos de nós continuamos a manter em relação ao função social que a biblioteca pública deve ter. A maior parte de nós não está disposta, por diversos motivos (quase sempre os mesmos), a sair dos seus gabinetes, a correr riscos, a trabalhar em rede, a estabelecer alianças, a ouvir os não utilizadores, a ser agentes de mudança e actores políticos na construção de uma sociedade mais equitativa, esclarecida e democrática.

Volvidos 20 anos após o início da Rede Nacional de Bibliotecas Públicas (RNBP) apenas 157 dos 308 munícipios de Portugal construiram uma biblioteca pública. Destas 157 bibliotecas públicas, supostamente modernas e inspiradas no «Manifesto da IFLA/UNESCO sobre Bibliotecas Públicas», muitas apresentam problemas preocupantes no que diz respeito à qualidade dos serviços prestados, à actualização dos fundos documentais, à quantidade e qualificação dos funcionários que aí trabalham, etc.

Portugal continua sendo um dos países mais pobres e atrasados da União Europeia e as bibliotecas públicas também são um indicador deste atraso.